Meu mundo subatômico: um dia habitado por
aranhas e bolhas de sabão, hoje é
constituído por fotografias. (1)
Não foi sem espanto que o século 20 se deparou com a potência do mundo subatômico. Um mundo composto por partículas mínimas que estruturam o que entendemos por realidade concreta e obedecem a uma lógica própria.
Da explosão de Hiroshima ao
desenvolvimento vertiginoso das telecomunicações, a humanidade se viu, a um só
tempo, aterrorizada e maravilhada diante do vigor do inimaginavelmente pequeno.
Quanto a mim, sempre tive
meu mundo subatômico particular. Talvez por isso nunca tenha me espantado o
poder das coisas diminutas. Mais que isso: sempre tive consciência de seu
potencial.
Na minha vida de criança, essa
consciência revelou-se de forma sui
generis e nada glamourosa. Meu respeito pelo mínimo se traduziu numa
atitude extremamente temerosa – e um tanto quanto neurótica – de enxergar perigos imensos em coisas pequeníssimas, como
um estranho cisco (quase invisível) que viera parar bem no meu prato; ou uma acanhada
aranha que se aproximava perigosamente.
O fato é que eu temia mais
uma formiga do que uma onça.
Idiossincrasias à parte,
meu interesse por mundos pequenos também teve uma face mais poética. Longe dos
perigos de ciscos, aranhas e formigas,
eu descobrira as bolhas de sabão. Para espanto materno, passava longos
minutos observando os mundos intangíveis que se refletiam nas pobres – e breves
– bolhas.
Também cultivei
secretamente o hábito de decifrar os desenhos escondidos nos veios de madeiras
e de pedras como o mármore. Na minha imaginação, esses veios, aparentemente
abstratos, guardavam mensagens misteriosas que pediam por compreensão.
Mas por que tanto amor pelo
insignificante, com tantas coisas maiores e mais reluzentes esperando para
serem amadas?
Ora, eu poderia fazer mil e
uma leituras psicológicas, como atribui-lo ao fato de eu também me sentir
pequena, ou outra coisa qualquer.
Mas acho que, no fundo,
posso dizer que meu interesse pelo que não tem amplitude vem da obviedade de
que ele é, em si, muito interessante.
O pequeno
não é apenas uma parte desse mundo maior e mais visível. Também não é uma mera
reprodução do grande – aquela ideia de que o macro se repete no micro. Ele é
muitos em um só. Guarda muitos mundos dentro.
As pequenas coisas do nosso
cotidiano são tão desprezíveis, tão pouco valorizadas, que acabam esvaziadas de
sentido. E o que está esvaziado de sentido pode ser aquilo que a imaginação
quiser. Responde à lógica do observador.
Vira matéria de poesia.
E é por isso que crianças e
poetas vêm tanto valor no lixo, no que já foi descartado e significa quase nada.
Hoje vejo aquele ingênuo exercício
infantil como um importante exercício para a vida. O exercício do encontro, de
estar diante de um mundo que não é o meu e tentar desvendá-lo.
O temor de insetos, aranhas
e ciscos passou. Revelou-se puro medo infantil.
Quanto às bolhas de
sabão...
Chamam-se, agora,
FOTOGRAFIAS – e seu potencial explosivo!
(1) Fotografia de meu acervo pessoal, 1980.
(1) Fotografia de meu acervo pessoal, 1980.
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